Perda de perdimento no crime do automóvel

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Há muito já escrevi artigos sobre a aplicação da pena de perdimento do veículo causador do acidente de trânsito, principalmente quando deles resultem na morte de alguém. É preciso esclarecer que a pena de perdimento de bens está prevista na Constituição e no Código Penal e em vários países é aplicada como corretivo penal. Apenas, gostaria que houvesse a séria intenção de nosso legislador em aprovar algumas normas que contribuíssem para a redução desta carnificina que a sociedade tolera com desgosto.

A Lei 11.343/2006, que “Institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas” estabelece a aplicação desta pena nos crimes que enumera. Diz o Art. 62:

“Art. 62. Os veículos, embarcações, aeronaves e quaisquer outros meios de transporte, os maquinários, utensílios, instrumentos e objetos de qualquer natureza, utilizados para a prática dos crimes definidos nesta Lei, após a sua regular apreensão, ficarão sob custódia da autoridade de polícia judiciária, excetuadas as armas, que serão recolhidas na forma de legislação específica”. O Art. 63 estabelece que “Ao proferir a sentença de mérito, o juiz decidirá sobre o perdimento do produto, bem ou valor apreendido, sequestrado ou declarado indisponível”.

Da mesma maneira, a legislação aduaneira estabelece o perdimento do veículo (carro, caminhão, aeronave, barco, etc.). O Regulamento Aduaneiro (Decreto 6.759/2009) prevê este procedimento em seu Art. 688, estabelecendo que nas hipóteses que enumera, além da perda da mercadoria transportada também haverá a perda do veículo transportador. Portanto, se alguém transportar em um veículo automotor meio quilo de alguma droga ou meia centena de pacotes de cigarros contrabandeados do Exterior terá o veículo apreendido e lhe será aplicada a pena de perdimento.

Sabe-se que a maioria dos acidentes nos quais resulta a morte de alguém, são causados por imprudência, imperícia ou negligência do condutor. No entanto, se alguém, em qualquer circunstância, matar alguém no trânsito será denunciado por crime culposo e nem ficará sujeito a uma pena privativa da liberdade de ir e vir.

Sendo assim, o motorista tem consciência de que o resultado de sua imprudência não resultará em uma punibilidade que lhe cause grandes prejuízos e o faça previamente refletir sobre as consequências de seus atos.

A comparação que faço entre os crimes de porte de drogas, do contrabando e descaminho com o crime decorrente do acidente de trânsito tem por objetivo demonstrar que para o ordenamento brasileiro aqueles crimes patrimoniais citados são mais valorizados do que os crimes de trânsito que resultam na morte de alguém.

Em resumo, a droga e o contrabando de maços de cigarros ou de garrafas de uísque adquirem maior valoração jurídica do que a vida humana.

É por isto que entendo que só será reduzida essa “guerra genocida” no trânsito se a legislação brasileira estabelecer como medida acessória a pena de perdimento do veículo causador do acidente que resultou na morte de alguém, salvo se devidamente comprovado que o veículo havia sido furtado ou o mesmo estava sendo usado para fins não autorizados por seu proprietário ou possuidor.

A minha sugestão para a elaboração de um Projeto de Lei (PL) é no sentido de que havendo a comprovação da materialidade e autoria do ato delituoso que resultou na morte de alguém, a autoridade policial, dentre outras providências, lavrará o auto de apreensão do veículo e assim que concluir o relatório com as provas colhidas encaminhará ao Juiz.

Feita a denúncia e configurada a verossimilhança do que ali consta, sem que se vislumbre alguma excludente de ilicitude, o Juiz, ao receber a denúncia homologará o ato de apreensão do veículo.

Ao proferir a sentença de mérito que condenar o réu, o Juiz determinará o imediato leilão do veículo no estado em que se encontra e o valor apurado será depositado em um Fundo destinado a reparar os danos causados no trânsito.

Se a decisão ao final do trânsito em julgado absolver o réu, o proprietário do veículo receberá o valor apurado no leilão devidamente atualizado.

Tenho certeza que o motorista que estará sujeito a perder o seu valioso (e mimoso) veículo pensará duas vezes antes de agir com imprudência, imperícia ou negligência, porque é mais do que sabido que a ameaça de uma perda patrimonial é a única coisa capaz de fazer alguém refletir antes de praticar algum ato.

Já sei de antemão que a minha ideia encontrará pela frente a repulsa das instituições financeiras, pois a maioria dos veículos que trafega em nosso território está alienada fiduciariamente a algum banco, sendo a garantia que os mesmos têm para a quitação do financiamento.